20 dezembro, 2016

Se tem uma coisa que me incomodou neste ano de 2016 foi a falta de respeito generalizada. Este ano foi um ano sem debate, sem mediação, sem consenso, sem qualquer tipo de esclarecimento ou crítica. Todas as decisões tomadas neste ano de 2016 foram arbitrárias, passaram por cima de qualquer tendência democrática do dito mundo livre. Neste ano que se encerra, me ficou cada vez mais claro que a democracia burguesa, que o dito estado democrático de direito é uma ilusão, um engodo para as massas analfabetas politicamente, senão moralmente perversas. A perversão na política institucional mostrou-se em sua totalidade, sem ocultar ou dissimular nada. E uma tropa de acéfalos bem alimentados aplaudiram toda esta perversidade. Rancière diz, no Ódio à democracia, que a democracia já é viciada desde o início, infelizmente não está errado o filósofo francês. Não vi coisa mais viciada neste ano que a palavra democracia, palavra saturada de vícios, palavra maltratada. Depois de tanto desrespeito, ainda teremos uma retrospectiva midiática cínica, bajuladora, falsa desde a raiz. Outra vez os palhaços aplaudem em nome de quê? O que tanto aplaudem essa gente que ignora que a corda sempre arrebenta do lado deles? Talvez isso seja apenas um sintoma de final de ano, um patologia social que nos toma conta antes de comer um galináceo gigante numa festa pagã.

14 dezembro, 2016

Em alguns anos não haverá mais indígenas no Brasil. A saúde pública se ainda tiver, estará sucateada e a educação completamente miserável. O acesso ao ensino superior estará tão caro e distante quanto sempre foi. As mulheres ainda não serão donas de seus corpos e os velhos morrerão de tanto trabalhar. As periferias incharão como nunca e as oligarquias estarão tão ricas como sempre estiveram. Não há redenção neste futuro, não há utopia moral que possa corrigi-lo. O futuro é apenas o reflexo de nossa condição, reflexo das contradições do individualismo, do empreendedorismo capital do indivíduo, do investimento na besta-dinheiro que corrompe a tudo e a todos que toca. Não há essência pura alguma por trás do solo frio e estéril do capital. Há apenas a perversidade do lucro, a brutalidade da guerra e da morte. Quem dera as utopias realistas se efetivassem como numa brincadeira de criança, onde a imaginação produz realidades sublimes e concretas. A besta-fera do dinheiro devora até as crianças e os seus sonhos, e os velhos brancos esqueceram que um dia foram crianças. Não há promessas de riquezas que possam tapar o dolorido buraco de uma vida sem imaginação, sem o recomeço da infância daqueles que sonham e lutam para que o brincar não se perca. A imaginação é como um suspiro olhando pela janela, cria mundos feitos de instantes.

12 novembro, 2016

O desenvolvimento econômico e social ocorrido no Brasil na última década é inegável, nunca se teve tão facilitado acesso à educação superior, a créditos e às melhoras na condição de vida do brasileiro médio. Nunca os ricos foram tão ricos, nunca os pobres tiveram tanto acesso, mesmo que parcos na sua radicalidade, a direitos e políticas sociais. Porém, nunca vimos tanto ódio destilado nas ruas, nas redes sociais, na internet, na política institucional, a céu aberto. Explicar de onde vem esse ódio, suas causas e seus efeitos é chover no molhado, ao menos para àqueles que com o mínimo de atenção e crítica aproveitaram todas as informações disponibilizadas de maneira cada vez mais rápida e imediata. Se há 30, 40 ou 50 anos atrás a repressão impedia toda forma de agrupamento e troca de ideias subversivas, hoje, muito em função da internet, podemos nos organizar contra essas práticas dos poderes hegemônicos e fazer frente aos retrocessos e as violências dos governos autoritários pelas vias digitais. Em larga medida o avanço do medo e do ódio também produziu uma massa de assujeitados pelo poder dominante, mônadas isoladas nos seus individualismos completamente idênticas umas a outras, reproduzindo todo tipo de lixo mais degradante e assombroso que alguém pode produzir. Receio em dizer que tais indivíduos são desumanos nas suas práticas, porque o fascismo é, ao meu ver, a expressão mais cruel do humano. Os regimes totalitários nazifascistas eram operados por humanos, por homens reais sob a justificativas de serem superhomens. Já disse em outra oportunidade das potencialidades monstruosas de homens reais capazes de extinguir a diferença representada por outros humanos. Diferenças conceituais entre homens e humanos à parte, o que estamos diante é inegavelmente produção de nossa cultura. Se a cadela do fascismo está sempre no cio, acredito que no Brasil ela está prestes a parir. Não quero ser fatalista ou pessimista, até porque isso me vem como um dado de realidade, ela está aí para quem estiver disposto a ver. Embora seja um diagnóstico ruim do presente, penso que o prognóstico do futuro possa ser melhor. Mesmo com tanto ódio nunca se viu tanta diversidade sendo celebrada, tantas vozes fortes e cantantes gritando por um futuro menos aterrorizante e opressor. Tantos jovens mostrando sua força crítica, sua potência em lutar e aprender cada vez mais. Engana-se aquele que pensa que a história do Brasil é a história do inconformismo popular, a história do adormecimento das vozes revolucionárias. Isto é o que as vozes hegemônicas querem nos fazer crer. Uma breve olhada em nossa história e veremos tantas insubmissões, tantas revoltas contra às violências institucionais. Enfim, já nem sei mais porque comecei esse texto, me deu vontade de escrever aos amigos atentos que têm um pouco dessa insubmissão em seus corações e mentes. Talvez a política seja um pouco de paixão, um pouco de enlouquecer diante de uma realidade tão angustiante. Então, fica aqui meu desabafo compartilhado com todos àqueles que têm fome e sede de justiça, que não estão na saudade e constroem a manhã desejada.

31 outubro, 2016

Eu acho que o Marchezan, o Crivella e o Doria foram eleitos já em 2013/2014.

Eu acho que o Marchezan, o Crivella e o Doria foram eleitos já em 2013/2014. Digo o por quê.
Porque em 2013 todos dizíamos, somos apartidários, não confiamos nos partidos e nos políticos que estão aí, que se vão todos. Talvez alguns não disseram isso de fato, mas foi isso que em grande medida fora dito pelos manifestantes. O que houve depois disso foi que vários partidos de direita, inclusive alguns muito pequenos disseram, viram, as ruas estão pedindo mudanças e nós podemos oferecer a mudança. Na época a mudança oferecida por esses partidos era referente aos 10 anos de governos petistas, no caso. A direita foi a primeira a se apropriar dos discursos das ruas, quando as ruas diziam algo completamente diferente. Porque a direita se apropriou daquilo que não tinha dono, que não tinha um nome ou objeto tão bem definidos. A esquerda respeitou a voz das ruas, mas não foi capaz de incorporar a vontade de mudança que queria se materializar em alguma coisa. Esses três candidatos supracitados ganharam as eleições com argumentos em comum, o novo, o do que foge à imagem do político tradicional e sobretudo, não eram de esquerda (entenda-se esquerda na leitura do eleitor comum alguma coisa como PT, vermelho, comunista, direitos humanos e afins). Enfim, meu argumento é, quem se beneficia com a repulsa à política e aos partidos são os candidatos que se dizem acima dos partidos, que não tem partido, que o partido é o Rio Grande. Marchezan ama Porto Alegre, Crivella ama a Universal, Doria ama camisas de alguma marca chique aí, ou seja, nenhum deles tem partido, ou alguém ouviu o Marchezan falar que o partido dele é o mesmo da Yeda ou etc?
A questão é, quando não tem partido quem ganha é a direita, por isso temo pelos movimentos que tem surgido e que tem afirmado que são apartidários mesmo com as melhores intenções. Se não for possível afirmar qual a posição que se está defendendo atualmente (digo no espectro direita e esquerda e mais além) e isso dando nome aos bois, veremos mais uma baita "convulsão" se metamorfosear em mini-craques com a camisa da seleção pedindo o retorno da Idade Média. Todos sabem que a política se faz de fato além dos partidos e além da política burguesa tradicional, mas essas malhas são complexas e não adianta se abster de se colocar nessa celeuma. Os movimentos estudantis têm grande força, mas terei que concordar com aqueles que dizem que esses movimentos não farão a revolução no país, porque esses movimentos precisam encadear um movimento maior e mais conectado, onde tenha mais articulação entre setores e forças diversas e isso, infelizmente para alguns, inclui partidos políticos organizados. Porém, esses precisam ser reinventados, oxigenados diante de uma direita que tem se aproveitado das antigas falhas estratégicas da esquerda institucionalizada. Para finalizar, penso que é necessário que se criem lideranças que possam aglutinar e dialogar com os mais diversos movimentos políticos que estão aparecendo para que esses discursos apartidários não acabem sendo cooptados por partidos de direita de fato.

24 agosto, 2016

A carta

Querido Adalberto,

É verdade que o tempo passou e nos perdemos no giro avassalador da vida. E também é verdade que as oportunidades passaram por nossa porta sem tocar a campainha quando estávamos mais empolgados. Mas o giro constante do mundo é cruel e somos pequenas partículas de sonhos esquecidos do passado. Talvez os caminhos da terra levem sempre ao mesmo lugar que enfim descansaremos, mas tenho a certeza de que nos falta mesmo é um pouco de coragem. Tenho pena dos dias em que passamos afoitos por um tantinho de vida que fosse, e sinto uma tal nostalgia dos frios na barriga de como quando a gente vive uma coisa pela primeira vez, só que ao contrário. O ser humano é, talvez, o único ser que presenteia a si mesmo com o passado e chora pela inevitabilidade do futuro.

22 agosto, 2016

Rio 2016

As Olimpíadas são um espetáculo pequeno burguês? São. Esse dinheiro todo podia ter sido investido em saúde, educação, cultura e saneamento básico? Claro. A realização desse evento encobriu um monte de maracutaia de toda espécie? Óbvio. Esquecemos do golpe de Estado e do golpe aos trabalhadores, estudantes e pessoas mais pobres pelo atual governo? Corretíssimo. Vimos machismo, racismo, homofobia, xenofobia, mentira e difamação ao longo de todo evento? Não tenho dúvida. Mas outra coisa que vi e não posso deixar de notar é como o esporte foi decisivo na mudança de realidades de vários de nossos atletas e que a presença de um evento despertou, em certa medida é claro, o que de melhor o país pode realizar. Vários de nossos atletas participaram desses jogos e conseguiram feitos inéditos em nossa história olímpica graças aos investimentos que tiveram, graças às apostas econômicas ou afetivas, graças ao trabalho e dedicação de uma porção de gente que não está só produzindo medalha, mas mudando realidades. Todas às críticas à realização das Olimpíadas foram justas e o Brasil quis, assim como a China em 2008, mostrar através dos jogos o seu desenvolvimento para o mundo. Essas foram as palavras de Lula lá em 2009 quando ficamos sabendo que sediaríamos esses jogos. Esse modelo que tentou ser mostrado foi bem sucedido? talvez sim, talvez não, talvez só a história dirá. Contudo, me parece fundamental pensar o que faremos daqui em diante. Não no nosso próximo mega evento mundial, mas em o que investiremos agora e em quem investiremos? Acho que é importante voltarmos nossa atenção novamente para os problemas que virão e que serão muitos, muitos deles retrocessos aos legados das Olimpíadas. Devemos continuar a investir nesses atletas que tanto se dedicaram para esses jogos, mas sobretudo, investir nas estratégias de saídas dessas tantas crises que nos encontramos. Esporte também é cultura, é também educação, saúde, desenvolvimento econômico e social. Não é só com murro em ponta de faca e post indignado no facebook que mudaremos nossa realidade, nem também com um "Não pense em crise, trabalhe" golpista, é enfrentando essa realidade como se fosse uma final olímpica, como se o ouro não fosse só uma medalha, mas todas as medalhas e vidas que querem um mundo diferente. Em 1980, o ursinho Misha chorava pelo fim dos jogos de Moscou, talvez pelo fim do sonho comunista soviético, mas no Brasil ninguém chorou, fora os tacanhas da Globo golpista que agora têm orgulho de serem brasileiros depois de venderem o país. Ninguém chorou no Rio porque muito já se chorou até aqui e como diz aquela expressão muito usada pelas nossas margens, luto para mim é verbo, movimento, batalha e conquista diária de quem quer viver um mundo melhor. Já temos tantos pessimistas, tantos críticos que parecem jogar no outro time, no time que só enxerga a derrota e são tão passivos diante dos ataques dos nossos reais adversários. Críticos que esperam debruçados sobre a janela à passagem da revolução, apostando no bem supremo de um futuro melhor sem sequer fazer da realidade o campo de obras ou de batalha para esse tal futuro. Já me cansei desses pessimistas, quero aqueles que dizem sim para as coisas potentes porque nelas está nossa saída. Invistam seus esforços nas Rafaelas, nas Martas, nos Isaquias, nos Silvas. Invistam nos nossos talentos de todas as áreas e não receberemos de volta apenas medalhas.

25 maio, 2016

Assistindo hoje ao Jornal do Almoço, saquei porquê ontem a brigada militar não reprimiu violentamente os manifestantes apesar de estar fazendo a segurança (particular) da sede do jornal Zero Hora. O que está por trás disso?
Isso serve apenas a um interesse, vendo a semiótica da coisa, que é a mensagem que diz que violentos são esses manifestantes (bandoleiros, comunistas, marginais, maloqueiros) que atacam o sagrado direito à informação ruim que é o abençoado compromisso do grupo (golpista) que tanto preza os queridos gaúchos. Percebem quantas informações (subliminares, subreptícias) estão por trás dessa coisa que é dar uma notícia?
O mesmo acontece com as notícias sobre a greve dos professores, sobre as ocupações nas escolas, sobre a ocupação lanceiros negros, sobre o MST, sobre qualquer coisa que vá de encontro aos interesses do Grupo RBS e seus apoiadores (políticos e econômicos). Não haveria problema se esses interesses não fossem completamente opostos aos interesses de outros grupos sociais, interesses básicos como educação de qualidade, respeito ao trabalhador e seu direito a ser dignamente remunerado por isso, direito à terra para plantar, direito à moradia nestes tempos frios. Mas não, esses interesses não são importantes porque eles não dizem respeito ao meu direito de ser enganado por esses canalhas que nos fazem acreditar que os interesses do Sartori e da Gerdal são os meus interesses.
O governador anunciou que dia 30 irá decidir se parcelará novamente os salários do funcionalismo, porém o salário dele não será parcelado, nem de seus secretários como o Vieira da Cunha que diz que não tem dinheiro para os professores, nem para ninguém. Mas os benefícios aos deputados estaduais, aos juízes, aos secretários têm todo o dinheiro que precisar.
Saber onde gastar o dinheiro é uma opção política e diz respeito apenas a interesses políticos e não de receita. Não Túlio Millmann, os professores não podem protestar sem prejudicar o ano letivo dos alunos, porque o governador já fez isso e os alunos estão juntos com os professores, lhes apoiando nesse que é o maior aprendizado. Ocupar e resistir.

03 abril, 2016

Não sou feministo

Existe muita demagogia quando os homens falam sobre o machismo e o sobre temas feministas e de fato é sempre um tema muito delicado quando abordado por homens, mas dos debates que tive com amigas feministas, saí sempre mais enriquecido e desacomodado em relação às minhas práticas diárias enquanto sujeito homem. Tenho visto muitos posts falando dos esquerdomachos e como eles capturam o discurso femininista e essa coisa toda. A grande verdade é que não existe homem feministo, é uma verdadeira trampa isso, a não ser que você seja um tipo de Deus muito desconstruído, aliás, desconstruído é a nova categoria moral para as pessoas hoje em dia, que apesar de ser ótimo ser desconstruído, temos que ver o quão fundo você é desconstruído materialmente. Por isso esse post, quando a coisa aperta, a desconstrução se reconstrói sob a fragilidade de assumir realmente um lugar que não é seu. Antes que eu seja mal interpretado como um desconstruidão esquerdo macho pós-moderno, eu não sou feminista. Mas não ser feminista me faz mais próximo das gurias que estão aí peleando e construindo um debate, do que se eu assumisse uma pecha que não me cabe. Contudo, isso não quer dizer sob hipótese alguma que nós homens devêssemos ser excluídos do debate, porque se assim fosse, não teríamos a oportunidade de nós homens sermos afetados pela diferença e participar de um mundo mais plural e rico nas suas singularidades. Ou seja, não roube o protagonismo que não é seu, mas participe para que esse mundo menos machista se torne cada vez mais realidade.

14 março, 2016

"Entre a direita e a esquerda eu prefiro o centro"

Não! Eu prefiro o debate aprofundado e qualificado de ideias, de posições de análises, sem cair em relativismos de cima do muro. Não é apenas a esquerda que está tensionando a polarização no debate público, a mídia (como eu digo sempre) também está, assim como a direita que tem vergonha de se assumir enquanto direita, seja ela conservadora, reacionária ou liberal. 
No debate político muitos ânimos se exaltam, mas não podemos cegar diante dos dados materiais de realidade. Enquanto discutimos a autonomia da babá que trabalhava na manifestação enquanto os patrões pediam o fim do comunismo, o mercado reage positivamente à instabilidade política do nosso país. Por que o mercado reage às instabilidades políticas? Especialistas em economia política podem responder com maior tranquilidade essa questão que apesar de parecer simples de ser respondida, revela a complexidade das conjunturas políticas no globo. 
A mídia enquanto isso, insiste na simplificação de um economês que nada diz ao cidadão comum sobre porque o pão está mais caro. A mídia trabalha com a simplificação de causa e efeito, enquanto o mundo gira numa complexidade avassaladora. Para o jornal do meio-dia a cidade está mais violenta porque não tem policiamento, mas deixa de questionar a falta de policiais, ou a falta de interesse político no aumento da segurança.